segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Bibliotecas digitais abrem seus acervos

Bibliotecas digitais abrem seus acervos

Dos tabletes de argila e pedra ao ciberespaço. Ao longo dos séculos a humanidade buscou as mais diversas maneiras de registrar, armazenar e transmitir idéias e sentimentos. Capaz de transformar mundos, a palavra escrita fez morada nos mais diversos suportes e atravessou o tempo resistindo a guerras, perseguições e transformações tecnológicas.
Templos de sabedoria foram erguidos para proteger tantas vozes. Numa história que antecede a do próprio do livro, as bibliotecas atravessaram o tempo e hoje encaram mais uma transformação: a sua configuração no espaço virtual.
No Brasil, instituições públicas têm encabeçado o processo de digitalização de bibliotecas e detêm, no país, os maiores acervos disponibilizados na rede. Um exemplo é a Biblioteca Nacional Digital (bndigital.bn.br), da Fundação Biblioteca Nacional, que possui o maior acervo digital do país com 14.300 itens entre livros, músicas, mapas, fotografias, arquivos sonoros, manuscritos, gravuras e obras raras. A Paraíba também tem destaque entre os links nacionais, com a Biblioteca Digital Paulo Freire, desenvolvida na UFPB e que reúne as principais obras de um dos maiores educadores do país.
Existe uma diferenciação conceitual entre os termos biblioteca digital e biblioteca virtual. No entanto, o que está no centro das discussões trazidas pela transferência e produção de livros para a rede mundial de computadores é a democratização do acesso e o desaparecimento do livro tradicional.
Segundo o biblioteconomista e mestrando em Ciência da Informação, Gustavo Henn, o processo começou bem antes do que pensamos. Já no século passado, Paul Otlet, considerado um dos pais da ciência da informação, sugeriu a microfilmagem, que transformava as obras em negativos e assim facilitava sua preservação e reprodução. A meta ambiciosa de Otlet era criar uma biblioteca central mundial de documentação jurídica, social e cultural.
No encontro anual de 1936, a American Library Association endossou o uso das microformas, mas já antes dessa aceitação oficial foram usadas entre 1927 e 1935 naBiblioteca do Congresso, que microfilmou mais de três milhões de páginas de livros e manuscritos da Biblioteca Britânica.
O processo avançou com o passar dos anos e hoje acessar conteúdos bibliográficos via internet se tornou algo comum e com promessas de muitos avanços. Gustavo Henn lembra que inclusive o acelerado avanço tem despertado grandes ambições, como a do Google Books de digitalizar todos os livros do mundo.
Para o biblioteconomista, as bibliotecas digitais promovem um acesso interessante a obras internacionais que não estão disponíveis no país ou aquelas cujas edições já se esgotaram. Ela acredita que o processo de digitalização é inevitável e avança numa velocidade assustadora, mas não acha que a procura pelo livro tradicional vai desaparecer da vida dos leitores. “As novas gerações já estão aprendendo a ler no computador. Se hoje é incômodo para nós fazer leituras longas na tela do computador, para meus filhos, que hoje são pequenos, não será problema. De todo modo, acredito que vai haver uma conivência entre as duas leituras. A digitalização ou o surgimento do livro eletrônico não acabam com o livro tradicional”, opinou Gustavo.
Biblioteca Nacional Digital possui maior acervo digital do país
A Biblioteca Nacional Digital (bndigital.bn.br), da Fundação Biblioteca Nacional, possui o maior acervo digital do país com produções que estão em domínio público. São 14.300 itens entre livros, músicas, mapas, fotografias, arquivos sonoros, manuscritos, gravuras e obras raras. Segundo Vinícius Martins, integrante da equipe da Biblioteca Nacional Digital, atualmente os documentos sonoros lideram os números do acervo com mais de quatro mil itens. Entre o material estão 2.700 são fotografias, 2.200 desenhos, 1.500 gravuras, 70 livros raros, 135 outros livros.
Vinícius explicou que quando foi criada, em 2005, a biblioteca deu prioridade ao material iconográfico e por isso não possui um grande número de livros. Quem lidera a oferta de livros na rede é o Portal Domínio Público (www.dominiopublico.gov.br), biblioteca digital do governo brasileiro que foi lançada em 2004 com um acervo inicial de 500 obras. O portal tem como principal objetivo promover o amplo acesso às obras literárias, artísticas e científicas - na forma de textos, sons, imagens e vídeos - já em domínio público ou que tenham a sua divulgação devidamente autorizada.
Algumas instituições também mantêm seus acervos disponibilizados na internet, como é o caso na Universidade Federal de Minas Gerais com a Biblioteca Digital Brasileira de Computação (BDBComp); da Universidade Federal de Santa Catarina com a biblioteca do Núcleo de Pesquisa em informática literatura e lingüística. Ainda temos a Biblioteca Digital da Universidade Estadual de Campinas, a Biblioteca Virtual - Brasil Escola, a da Fundação Joaquim Nabuco, a Biblioteca Virtual em Saúde, entre outras.
Na Paraíba a Biblioteca Digital Paulo Freire (BDPF) (www.paulofreire.ufpb.br) tem destaque nacional. Criada em 2000 na Universidade Federal da Paraíba, a BDPF tem por objetivo principal disponibilizar pressupostos filosóficos, sociológicos e pedagógicos do pensamento freireano. Foi digitalizado o acervo de Paulo Freire no intuito de disponibilizar o acesso mais amplo possível a estes documentos via web.
Na biblioteca podem ser encontrados livros, discursos, cartas e textos didáticos produzidos pelo autor, assim como materiais produzidos sobre ele.
Professor de literatura
Como um verdadeiro agente de viagens para mundos desconhecidos sem sair do lugar, o livro é bem mais que um conjunto de palavras. Na concepção do professor de literatura Rosenberg Frazão, o processo de leitura envolve uma concepção lúdica que tem no manuseio do livro, seu cheiro e textura valores simbólicos na relação com leitor. “Com a digitalização esses detalhes desaparecem, e isso pra mim faz uma grande diferença. No entanto, temos que admitir que para as gerações futuros isso não será problema”, disse o professor.
Para Rosenberg, os livros digitais não têm a mesma portabilidade que o tradicional (mesmo com o livro eletrônico recém desenvolvido), sem falar nas possibilidades de alteração do conteúdo e em uma democratização do acesso, segundo ele, meio fajuta. “Claro que permite um acesso mais fácil a certas obras, mas para determinado público. Para se ter acesso ao material digitalizado é preciso ter um computador, o que não é a realidade de muitos brasileiros. Aliás, nem saber ler não é para todos no Brasil”.
Pela experiência de 11 anos em sala de aula, o professor divide os estudantes em três grupos. Segundo ele, a grande maioria não se interessa pela leitura. Um segundo grupo, um pouco menor, faz parte da geração mergulhada no mundo em rede e acessa textos e obras mais pela internet. O terceiro grupo, minoria mais ainda número considerável, é composto pelos que gostam de ler e ainda preferem o livro tradicional.
Rosenberg acredita que ainda vai demorar para que o conteúdo eletrônico supere o impresso, mas sabe que o processo é inevitável e reconhece suas vantagens. “Há que se ter cuidado para não tornar a leitura um ato mecânico, fragmentado e sem profundidade”, concluiu o professor.


Fonte: Jornal Correio da Paraíba em08-11-09

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